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RECOLHIMENTO COMPULSÓRIO: A NOVA ORDEM DAS POLÍTICAS DE SAÚDE E ASSITÊNCIAS

 RECOLHIMENTO COMPULSÓRIO: A NOVA ORDEM DAS POLÍTICAS DE SAÚDE E ASSITÊNCIAS

Fonte: Jornal do CRP - RJ n0 34 * Setembro/Outubro/Novembro de 2012

Relatório mostra que crianças e adolescentes usuários de crack estão sendo
encarceradas e dopados em unidades de "acolhimento" da prefeitura do Rio.
Psicólogos e especialistas analisam os retrocessos, aas ilegalidades, a
ineficácia e os interesses por trás dessa política.

Era início de janeiro de 2009 e Eduardo Paes vivia seus primeiros dias
frente à Prefeitura do Rio de Janeiro. rapidamente, um dos programas
prioritários de sua campanha, o chamado "Choque de Ordem", foi sendo
colocado em prática. Após uma ação inicial, que mobilizou cerca de 1500
agente municipais e contou com o apoio do governo do estado, o prefeito
divulgou à imprensa os resultados: um prédio demolido, cerca de 80 vans e
kombis vistoriados, seis veículos multados, diversas mercadorias apreendidas
em oito estabelecimentos comerciais, além de cerca de 300 cadeiras de praia,
70 guarda-sóis, seis caixas de isopor, oito bicicletas e 23 carrinhos de mão
confiscados na subida da comunidade do Pavão- Pavãozinho, favela localizada
em Ipanema, área nobre da cidade..

Em pouco tempo, a política do Choque de Ordem ganhou espaço nos debates
políticos, na imprensa e alcançou visibilidade nacional. Nos parlamentos,
na academia, na imprensa e nos papos de botequim, o programa da prefeitura
era definido e atacado com igual veemência. Por um lado, os entusiastas
reforçavam a necessidade urgente de uma política agressiva de combate à
"desordem urbana", caracterizada no site da prefeitura como "grande
catalisador da sensação de insegurança pública e geradora de condições
propiciadoras à prática de crimes, de forma geral". Por outro, ganhava corpo
um conjunto de críticas que apontavam para a ineficiência e para o caráter
repressivo, seletivo e arbitrário das medidas adotadas.

O Conselho Regional de Psicologia do Rio de Janeiro sempre se posicionou com
esta perspectiva crítica. As denúncias de graves violações de direitos
humanos e de desrespeito aos devidos procedimentos legais foram se
multiplicando na mesma proporção que a prefeitura intensificava e estendia
suas ações, somado a isso, analistas questionavam as prioridades e as
intenções por trás destas ações, direcionadas prioritariamente a
trabalhadores informais, moradores de comunidades pobres e pessoas em
situação de rua.

 
O XERIFE DA 'ORDEM'
Um dos artífices do 'Choque de Ordem' foi Rodrigo Bethlem, que comandou por
dois anos a Secretaria de Ordem Pública (SEOP), idealizada por Paes antes
mesmo de assumir a prefeitura. Bethlem foi escolhido para o posto por seu
currículo, que incluía a coordenação das operações Copabacana, Ipabacana e
Barrabacana, políticas implementadas pelo governo do estado em bairros
nobres da capital, e que se tornaram célebres pelo recolhimento compulsório
durante as madrugadas de crianças e adultos em situação de rua. À frente da
SEOP, o secretário driblou as críticas e até mesmo as acusações de
envolvimento com milícias e ganhou prestígio na Prefeitura, sendo alcunhado
por parte da imprensa como "xerife" da cidade.

No início de 2011, uma alteração chamou a atenção de entidades que atuam no
campo de assistência e saúde: Rodrigo Bethlem, que é economista, tem uma
formação voltada para o mercado financeiro, e não tinha nenhuma experiência
ou acúmulo nos debates sobre assistência e saúde, assumiu a Secretaria
Municipal de Assistência Social (SMAS), onde permaneceu até 4 de junho de
2012, data em que pediu exoneração para colaborar na companhia à reeleição
do atual prefeito. Para além de sua completa inexperiência, profissionais e
militantes da área afirmavam que sua defesa de políticas rígidas de
repressão e de controle dos espaços públicos se chocava com diretrizes que
apontavam para a construção de uma rede multidisciplinar e integrada de
equipamentos de assistência e saúde.

A preocupação se mostrou pertinente. foi na gestão de Bethlem que, sob
pretexto de combater uma suposta "epidemia" de uso de crack, a Secretaria
Municipal de Assistência Social (SMAS) lançou em maio de 2011, um novo
protocolo de abordagem a pessoas em situações de rua na cidade do Rio de
Janeiro. A medida que ficou conhecida como Resolução n0. 20, instituiu o
recolhimento compulsório de crianças e adolescentes que "na avaliação de
especialistas", estivessem "comprometidas" pelo uso de drogas psicoativas.

ACOLHIMENTO COMPULSÓRIO?
Assim como o CRP manteve sua postura crítica em relação à política do
'Choque de Ordem', desde o início denunciamos, junto com estudiosos,
profissionais, militantes e outros conselhos regionais da área de saúde e
assistência, a política de recolhimento compulsório da Prefeitura do Rio por
contrariar princípios básicos preconizados no Estatuto da Criança e do
Adolescente (ECA), nas políticas de Saúde, Saúde Mental e Assistência
Social, e em outras normativas nacionais e internacionais.

Ainda em 2001, em parceria com o conselho regional de Serviço Social
(CRESS-RJ), Enfermagem (COREN-RJ) e Nutrição (CRN-RJ), o CRP realizou
fiscalizações em equipamentos direcionados para a aplicação desta política.
Foram identificados, dentro outros problemas, ausência de ações
intersetoriais, medicalização excessiva dos abrigados, prejuízo da
convivência familiar e comunitária, e dificuldade de acesso aos abrigos
devido à localização distante dos centros urbanos.

Diante das críticas e denúncias, a Prefeitura tomou apenas uma medida:
deixou de usar o termo 'recolhimento compulsório' passando a usar o conceito
de 'acolhimento compulsório'. "É contraditório. 'Acolhimento' e
'Compulsório' são palavras inconciliáveis", disse o conselheiro do CRP
Lindomar Darós (CRP 05/20112) em audiência sobre o uso do crack por crianças
da Comissão de Saúde da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (ALERJ), em
maio deste ano. "A prefeitura ignora que acolhimento se faz somente com a
construção de vínculos e respeitando o 'tempo do usuário'. 'Recolhimento' é
uma medida fascista e compulsória, que encara as pessoas como coisas".
No mesmo mês em que audiência sobre crianças e crack foi realizada, o CRP,
em ação conjunta com o Conselho Regional de Serviço Social (CRESS-RJ), o
Grupo Tortura Nunca Mais (GTNM/RJ), o Comitê e o Mecanismo de Prevenção e
Combate à Tortura da ALERJ, além da Comissão de Direitos Humanos da ALERJ e
do Núcleo de Direitos Humanos do Departamento de Direto da PUC - Rio,
realizou novas ações de fiscalização em quatro estabelecimentos vinculados à
Casa Espírita Tesloo, instituição religiosa espírita conveniada com a
Prefeitura, que recebe crianças e adolescentes recolhidas compulsoriamente
em situação de rua. O relatório destas ações, recém divulgado, reafirma a
avança nas análises feitas anteriormente pelo Conselho.



ORIENTAÇÃO RELIGIOSA FERE ESTADO LAICO

Um dos aspectos que mais preocuparam as entidades que fizeram as
fiscalizações aos abrigos foi a orientação religiosa dada ao tratamento nos
estabelecimentos. apesar de ter sido informado às equipes de fiscalização
que a organização não era religiosa e que o trabalho não se dava a partir de
uma perspectiva teológica, foi verificado a ocorrência de diversas regras e
mensagens que remetiam à prática religiosa.
"Estes aspectos estão em desacordo com a prerrogativa de laicidade do Estado
e de suas políticas públicas, mesmo quando essa políticas estão sendo
executadas por organizações não governamentais.
A chamada metodologia dos 12 passos, usadas em todos os abrigos e com teor
fortemente espiritual e religioso, é questionada por especialistas e não é
reconhecida por políticas públicas de saúde. A metodologia dos 12 passos, em
que o despertar espiritual passa a ser a primeira forma de tratamento, junto
de uma medicação excessiva, é algo que o Ministério da Saúde jamais
recomendaria", afirma o presidente da Comissão de Direitos Humanos da ALERJ,
deputado estadual Marcelo Freixo.

 
ISOLAMENTO
A privação do contato e do convívio familiar e comunitário foi o primeiro
aspecto que chamou a atenção da equipe de fiscalização. Os "abrigos
espacializados" da Prefeitura - como são chamados - que foram vistoriados
estão todos na zona oeste, nos bairros de Campo Grande e Guaratiba, mas
recebem crianças e adolescentes recolhidos compulsoriamente em diversas
áreas da cidade, a até 60 km de distância do local. A própria equipe de
fiscalização relatou dificuldades para encontrar os estabelecimentos, que
estão localizados em endereços de difícil acesso.
Para piorar a situação de isolamento, há uma limitação para contato
telefônico com a família que varia entre apenas um ou dois dias por semana,
dependendo do abrigo, bem como apenas um ou dois dias para visitação. As
crianças e adolescentes passam o dia inteiro no abrigo e ficam proibidos de
ir à escola.

MEDICALIZAÇÃO DESCONTROLADA
O uso de medicamentos foi outro fator observado. Recentemente, a Defensoria
Pública visitou a Casa Ser Criança, um dos abrigos fiscalizados, em
Guaratiba, e encontrou um adolescentes de 15 anos com claros sinais de
dopação. O garoto estava ali havia três dias, mas ainda não havia sido
sequer avaliado por um médico. questionados, funcionários do
estabelecimento, disseram que a medicação havia sido prescrita por telefone.
O relatório constatou a "medicalização diária e generalizada de seus
abrigados" não apenas naquela unidade, mas nas quatro instituições
vistoriadas. As equipes foram informadas que os garotos abrigados tomam, por
padrão, quatro tipos diferentes de medicamentos diariamente, além de
injeções compostas por Haldol e Fenergan (os chamados SOS ou "Sossega
Leão"), caracterizando a prática recorrente de contenção química das
crianças e adolescentes. Além disso, constatou-se que os mesmos medicamentos
são usados na mesma dosagem em meninos de diferentes idades e complexões
físicas, sem que tampouco sejam levados em conta aspectos psicológicos e
socioculturais.
FALTA DE INFORMAÇÃO
O uso de medicamentos e a falta de avaliação médica se somam à total falta
de informação consolidada sobre os efeitos do tratamento. Não há relatórios
sobre a evolução clínica dos garotos. A única clareza que se teve, através
de relatos de funcionários, é que o número de reincidências no tratamento é
altíssimo. Relatos dão conta de crianças que foram recolhidas
compulsoriamente por até três vezes em um curto espaço de tempo, bem como de
crianças que ficam até três meses em um estabelecimento (tempo máximo de
permanência) e que em seguida, são transferidos para outro da mesma
organização gestora, sem que para isso haja avaliação e justificativas
técnicas.

'INTERNAÇÃO' OU 'ABRIGAMENTO'?
A partir destes fatos e das entrevistas realizadas com gestores e
funcionários, a principal conclusão do relatório é a de que existe na
política da prefeitura uma "confusão deliberada" entre 'internação' e
'abrigamento', isto é, entre tratamento clínico para usuários de álcool e
outras drogas e assistência social. "Esses 'abrigos especializados' são
registrados nos órgãos e conselhos de assistência, e não naqueles de saúde.
No entanto, há uma sobreposição do tratamento à dependência química em
relação acolhimento socioassistencial", diz o texto do documento, que afirma
que "isso parece ser confuso inclusive para trabalhadores desses locais".

A VOLTA DO MODELO MANICOMIAL
Para Alice de Marchi (CRP 05/38379), colaboradora do CRP que participou das
fiscalizações e da elaboração do relatório, a concentração destes diferentes
aspectos em um único equipamento representa um retrocesso nas políticas de
Assistência Social e de Saúde Mental: "Essa é a própria lógica da
instituição total, encontrada em manicômios, na antiga FEBEM, em presídios",
afirma, destacando também o caráter de privação de liberdade encontrado nos
estabelecimentos que foram fiscalizados. "A política de recolhimento
compulsório flerta perigosamente com o modelo manicomial de
institucionalização e exclusão do convívio social", reforça.
Em audiência pública no dia 12 de junho, organizada pela Comissão de
Direitos Humanos da ALERJ para apresentar os relatórios, a psicóloga
explicou que as diretrizes das políticas de saúde e assistência já apontam
para o fortalecimento de uma rede composta por diversos estabelecimentos e
equipamentos intersetoriais, multidisciplinares e articuladas entre si".
Estamos falando dos CRAS e CREAS dos CAPS, CAPS AD e CAPSI, das unidades de
acolhimento, dos consultórios de rua, dos abrigos, casas de passagem e
repúblicas, dos programas de família acolhedora, de Saúde da Família, de
Agentes Comunitários de Saúde, dos ambulatórios de hospitais, entre outros
projetos e serviços e equipamentos que já existem e que foram desenvolvidos
e aprimorados no âmbito das conferências nacionais de saúde, saúde mental e
assistência, fóruns competentes para a proposição de políticas públicas para
a área".

VIOLAÇÃO DE DIRETRIZES E PRECEITOS LEGAIS
Para ela, devido à resolução n0 20, estes equipamentos têm sid
negligenciados no tratamento a usuário de álcool e outras drogas e na
assistência à população em situação de rua no Rio de Janeiro, em claro
descumprimento de diretrizes políticas do Ministério da Saúde (MS) e do
Ministério de Desenvolvimento Social (MDS) - como é o caso, por exemplo, da
Política para a Atenção Integras a Usuário de Álcool e Outras Drogas e das
portarias 224/1992 e 336/2002, do Ministério da Saúde. "O município do Rio
de Janeiro possui apenas três CAPS AD e cinco CAPSIS. A prefeitura não
encara a questão das drogas como questão de saúde pública, e a rede
existente não consegue dar conta da demanda" diz Alice, cobrando
investimentos e incentivos. A doutora Eufrásia Maria Souza das Virgens,
titular da Coordenadoria e Defesa da Criança e do Adolescente da Defensoria
Pública do Rio de Janeiro lembrou da audiência que o município já foi
condenado pela justiça em Ação Civil Pública de 2002 impetrado pelo
Ministério Público Estadual, por não possuir serviço de saúde adequado para
usuário de drogas. Eufrásia informou ainda que a Defensoria entrou com ação
em 2011 questionando a legalidade da Resolução n0 20 e pedindo o cumprimento
da Deliberação 763/2009, emitida pelo Conselho Municipal dos Direitos da
Criança e Adolescentes em Situação de Rua, estabelecendo "diretrizes
baseadas na intersetorialidade das Políticas Públicas" e resgatando uma
série de marcos legais que devem reger as políticas de assistência a
crianças e adolescentes.
"O chamado 'acolhimento compulsório' é uma figura jurídica inexistente e
'abrigamento' não implica em privação de liberdade" disse Eufrásia. "A
prefeitura deve se lembrar que crianças e adolescentes são sujeitos de
direitos. A Resolução n0. 20 afronta não apenas a Deliberação 763, mas a
Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA),
especificamente em seu artigo 11".

A EXCEÇÃO QUE VIROU REGRA
Militante da Luta Antimanicomial, o psiquiatra e pesquisador Edmar das
Oliveiras, também compondo a mesa da audiência pública do dia 12 de junho,
foi enfático: "A Lei 10.216/2001 (Lei da Reforma Psiquiátrica) está sendo
ferida de morte", disse ."A lei já prevê e regulamenta internações
voluntárias, involuntárias e compulsórias, sendo que esta última dependem
exclusivamente de determinação do Poder Judiciário", afirmou o médico.
O consultor da Política Nacional de Humanização (PNH) do Ministério da
Saúde, Iacã Macerata (CRP 05/38806), concorda. "A prática da internação
compulsória é uma ação antiga no âmbito da assistência social, do conselho
tutelar, juizado da criança e do adolescente, para crianças e adolescentes.
Porém ela era realizada depois do fracasso de todas as estratégias, servindo
de medida de proteção, sendo um trâmite judicial aplicado caso a caso. No
Rio a exceção foi feita regra geral", explica o psicólogo, que estuda
políticas sobre população de rua. "Anteriormente, a internação só era
solicitada após meses de tentativas com determinado caso, e quando a
situação da criança e adolescente era comprovadamente de extremo risco",
completa.



CONTRATOS DA TESLOO SOMAM 67 MILHÕES


Os quatro estabelecimentos fiscalizados para o relatório sobre recolhimento
compulsório, fora a Casa Ser Adolescente, o Centro de Atendimento à
Dependência Química Dr. Bezerra de Menezes e o Centro de Atendimento à
Dependência Química Dr. Manoel Philomeno de Miranda. Todos gerenciados pela
Casa Espírita Tesloo, uma organização não governamental, e estão localizados
na zona oeste, nos bairros de Campo Grande e Guaratiba.
Presente na audiência pública de lançamento do relatório, a vereadora Andrea
Gouvêa Vieira informou que seu mandato está investigando contrato da Tesloo
com a prefeitura, que segundo ela, somariam cerca de 40 milhões de reais. No
entanto, dados do Tribunal de Contas do Município registram 67,2 milhões de
reais em contratos firmados entre 2009 e junho de 2012.
A Casa Espírita Tesloo é dirigida por um policial militar reformado e por
sua família. Para Tiago Régis, assessor de políticas públicas do CRP-RJ,
este pode ser considerado um dos indícios de que a política de recolhimento
compulsório ignora diretrizes e políticas do campo da Saúde e da Assistência
Social, mas flerta com a lógica da Segurança Pública.

ALÉM DE TUDO INEFICAZ
Iacã aponta para a ineficácia da politica de recolhimento compulsório. "A
saída da rua deve ser em primeiro lugar uma alternativa dada à pessoa, em um
processo que envolve uma relação de cuidado baseada na veiculação e a
construção de uma série de outras alternativas", diz. Lembrando do alto
nível de reincidência constatado nos 'abrigos especializados' vistoriados em
maio. "A simples retirada da rua costuma resultar na volta da pessoa à rua
após a internação, cronificando ainda mais a situação, já que o que se
produz é mais um 'fracasso' na vida da pessoa", completa.
O pesquisador também cobra investimentos públicos: "Vemos muito dinheiro
sendo injetado nestas ações de recolhimento, mas vemos pouquíssimo recurso
sendo destinado à construção de redes de políticas públicas que permitam
construir condições efetivas de mudança na vida das pessoas em situação de
rua", denuncia. "Nessa política, a permanência fora da rua só se sustenta
enquanto a pessoa estiver internada ou presa".
Na opinião de Iacã, o uso abusivo do crack, neste contexto, é encarado como
a causa do problema, quando a realidade mostra que é apenas um efeito diante
de um conjunto d problemas. Rafael Dias (CRP05/40094) representante de CRP
no Conselho Estadual de Políticas sobre Drogas concorda: "A prefeitura do
Rio de Janeiro não aborda de modo consistente o uso do crack. A falta de
incentivos a equipamentos como os CAPS AD e os Consultórios de Rua são
exemplos evidentes disso", diz o pesquisador. "O que vemos é que as ações de
recolhimento compulsório empreendidas, além de violarem políticas públicas e
marcos legais, não têm qualquer embasamento técnico e político, nem
resolutividade do ponto de vista clínico.

INTERESSES ECONÔMICOS
Mas, afinal, diante das críticas e denúncias de profissionais, entidades,
militantes e pesquisadores da área de saúde, diante da inconsistência
técnica e da ineficácia de tais ações, o que motivaria então a Prefeitura
insistir nessa política?
Para Rafael Dias, a resposta requer uma análise mais complexa, mas passa por
interesses econômicos. "A prefeitura, junto com diversos setores, difunde um
pânico moral em torno da questão do crack para levar a cabo uma política
higienista que é regida pelo segregacionismo das classes mais altas e pelos
interesses de grupos ligados à especulação imobiliária, ao comércio, à
indústria do turismo, entre outros", diz. atribuindo o endurecimento de
políticas repressivas e elitistas à preparação da cidade para realização da
Copa do Mundo de Futebol e dos Jogos Olímpicos. "Esses eventos são grandes
oportunidades de negócios para certos grupos de empresários. É um modelo de
cidade que requer a produção de mais controle e aprisionamento",
diagnostica.

Diversas falas convergem para a avaliação de Dias. Para Iacã Macerata, "a rua
coloca questões insuportáveis para a lógica hegemônica da cidade, onde
governantes são apenas a representação de um desejo xenofóbico de parte da
população de ver a cidade "limpa". O pesquisador também cita a força do
mercado imobiliário, as transformações urbanas levadas a cabo para os
megaeventos esportivos e o "apelo da própria população em se ver livre a
qualquer custo dos "indesejáveis"
Para o presidente da Comissão de Direitos Humanos da ALERJ, deputado Marcelo
Freixo, "essa é uma política que atende à lógica da ordem que é elitista e
busca invisibilizar o outro. A preocupação maior é com a rua e não com as
pessoas". Edmar das Oliveiras é ainda mais direto: "Não se faz a inclusão de
ninguém com ações repressivas. A política de recolhimento compulsório é a
'limpeza' da área para a Copa e as Olimpíadas, diz.
Tiago Régis, assessor de políticas públicas do CRP- RJ resume as análises:
"As ações de recolhimento compulsório e de enfrentamento ao uso de crack no
Rio de Janeiro não se guia pelo campo da Saúde, da Assistência ou dos
Direitos Humanos. Políticas e saberes historicamente construídos nestas
áreas são arbitrariamente ignoradas", diz. O recolhimento compulsório da
Prefeitura de Eduardo Paes e do 'xerife' Rodrigo Bethlem segue uma
perspectiva de cidade em que o 'marketing urbano' impõe-se como uma esfera
determinante nos processos de planejamento e gestão urbana. Para poder
melhor apresentar ao grande mercado global o seu 'produto' - nesse caso, a
cidade - é preciso dar-lhe uma boa 'aparência', reordená-lo 'embelezá-lo',
completa Tiago, comentando que esta é a mesma lógica da política do 'Choque
de Ordem', da Secretaria de Ordem Pública.
A diferença é que, em lugar de cadeiras de praia, caixas de isopor e
carrinhos de ão, a Secretaria Municipal de Assistência Social tem recolhido
pessoas.


PARA ENTENDER MELHOR
POLÍTICA DO MINISTÉRIO DA SAÚDE PARA A ATENÇÃO INTEGRAL A USUÁRIOS DE ÁLCOOL
E OUTRAS DROGAS (
http://bit.ly/Politicas MS_AD)
DELIBERAÇÃO 763/2009 (CMDCA/SMAS) - INSTITUI POLÍTICA MUNICIPAL DE
ATENDIMENTO DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES EM SITUAÇÃO DE RUA
(
http://bit.ly/Deliberacao763)
PORTARIA N0 336/2002 - MINISTÉRIO DA SAÚDE (
http://bit.ly/Portaria336)
PORTARIA N0 224/1992 - MINISTÉRIO DA SAÚDE (
http://bit.ly/Portaria224)

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